Sexta-feira, 21 de Outubro de 2011

 

Leio o último livro de Philip Roth (Némesis, da D. Quixote, título cujo significado daria pano para mangas), um regresso a uma fase recente muito existencialista. Talvez a idade já avançada do autor explique este fascínio com a morte e com a procura de respostas sobre questões que desde o início dos tempos o homem coloca a si mesmo: Qual é o sentido da vida? Qual é a justiça dos homens e dos seus deuses? O que fazemos aqui? Porque é que Deus castiga os indefesos? Porque é que Deus leva as nossas crianças em doenças estúpidas? (O que, no caso em apreço, tem que ver com um bairro judeu de Newark assolado, em 1944, por uma epidemia de poliomielite) Há algo ali que perturba. Que me perturba como poucas coisas na vida. Por mais voltas que dê, fico sempre com mais dúvidas do que com certezas. E as palavras escorreitas juntas em frases de uma beleza fria tocam no âmago das minhas próprias interrogações existenciais que, de tempos a tempos, me depredam um pouco preparado espírito, deixando-me abalado, ao mesmo tempo que me deixam triste porque há naquela estética literária algo de maravilhoso mas igualmente de desesperante. De cada vez que leio um Roth assim, digo a mim próprio que é o último que leio e que o abandono de vez, logo a ele que é só o meu escritor favorito. Mas o problema é que ele regressa sempre e torna-se um vício de que não me consigo libertar. Há grandeza naquelas palavras sábias porque só um grande escritor pode escrever assim. E hoje, se reflicto muito no assunto, sinto que podia enlouquecer porque ele tem o incrível dom de por vezes não me querer deixar adormecer. E é nessas alturas que olho à minha volta e sinto vontade de abraçar os meus. E de agradecer a Deus ter-me poupado, até agora, a tanto drama e pensar que tudo isto podia de facto ser bem pior.

 

Publicado originalmente aqui.



publicado por Bruno Miguel Macedo às 09:42 | link do post | comentar

2 comentários:
De Miguel Pestana a 21 de Outubro de 2011 às 10:55
Excelente opiniao sobre o livro.

Posso dizer que do autor apenas li "Conspiração contra a America", mas penso que não foi a obra que deveria ter lido primeiro do autor. Não que não tenha apreciado, até porque a temática central do livro era de meu interesse.

Mas espero ler outras obras de Philip Roth.

Boas leituras


De Bruno Miguel Macedo a 21 de Outubro de 2011 às 16:38
Caro Miguel: obrigado pelo seu comentário. Como deve calcular, sou suspeito quando falo do Roth porque ele é o meu escritor favorito. Ainda assim, quando tiver oportunidade, descubra outros livros dele, porque valem a pena. E em português, tem por onde escolher.


Comentar post

Publius Cornelius Tacitus
To ravage, to slaughter, to usurp under false titles, they call empire; and where they made a desert, they call it peace.
Outubro 2017
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4
5
6
7

8
9
10
11
12
13
14

15
17
18
19
20
21

22
23
24
25
26
27
28

29
30
31


posts recentes

Os incêndios que matam pe...

A síndrome socialista

Soltar os cães

Um argumento

Regressando

Um papel

A cartilha

Prometeu

Um ou dois milagres

Uma nomeação

arquivos

Outubro 2017

Junho 2017

Março 2017

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Maio 2015

Abril 2015

Setembro 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

tags

anáfora

antonomásia

benevolentes

blanchett

bloco

cate

charme

dench

djisselbloem

eufemismo

eurogrupo

guerra

gwyneth

helen

jonathan

judi

littell

metáfora

mirren

paltrow

perífrase

porto

prosopeia

renda

sela

socialismo

twitter

ward

todas as tags

links
blogs SAPO
subscrever feeds