O tipo que assassinou 77 pessoas e feriu outras 151, o norueguês Anders Behring Breivik, pode afinal ser inimputável. A conclusão é de especialistas que o avaliaram na cadeia onde se encontra detido, sinal de que certos crimes, de tão monstruosos, exigem sempre explicações racionais. Nestes enquadramentos surgem geralmente três teorias justificativas: uma que transporta a culpa para a sociedade; outra que faz do carrasco potencial vítima de uma família disfuncional e violenta; e uma última que incide nas questões de foro psiquiátrico e mental da besta, ilibando-a ou menorizando as suas acções. Lamentavelmente ficam de fora, muitas vezes, a própria natureza humana, e a bestialidade e a maldade intrínsecas ao ser humano. Por mais que se evite falar disso, o mal existe e o homem não nasce “naturalmente” bom, como certas teorias positivistas defendem. Com um forte propósito e motivação, a maldade humana tem, neste caso em concreto, um rosto: chama-se Anders Behring Breivik. Não nos esqueçamos disso.
O grande amor de Svetlana foi Sergo Béria, filho desse monstro-mor da corte de Estaline, Lavrentiy Béria, que se julgou capaz de suceder a Estaline depois da sua morte em 1953. O Béria-pai, acabaria fuzilado em Dezembro desse ano, depois de Kruschev, um oportunista, tomar o poder. Svetlana nunca conseguiu conquistar o Béria-filho e sofria imenso com isso.
Mas Estaline, apesar de tudo, era afável e por vezes carinhoso com a filha. Só que a brutalidade indescritível de um dos maiores bárbaros do século passado, dá muito que pensar. E para entender melhor este tirano, quase derrotado por Hitler no estertor da resistência russa, e a sua realpolitik, nada como contar uma anedota que ele próprio repetia inúmeras vezes desde que se havia tornado claro que a grande guerra patriótica, como era conhecida a II Guerra entre os russos, já só podia pender para o lado russo. E dizia assim:
«Churchill, Roosevelt e Estaline foram à caça. Finalmente, conseguiram matar um urso. Churchill disse: “Eu fico com a pele. Roosevelt e Estaline que dividam a carne”. Ao que Roosevelt disse: “Não, eu fico com a pele. Churchill e Estaline que dividam a carne”. Estaline não dizia nada de modo que Churchill e Roosevelt lhe perguntaram: “Então Senhor Estaline, que diz?”. Estaline limitou-se a responder: “O urso pertence-me. Ao fim e ao cabo, fui eu que o matei”». (In Estaline –A corte do czar vermelho de Simon Sebag Montefiore, pag. 476) Naturalmente, o urso era Hitler e a pele do urso era a Europa de Leste. Nem é preciso relembrar o que aconteceu depois.
A Sábado, sempre atenta aos assuntos do momento, decidiu aferir a cultura geral dos nossos estudantes universitários. Num conjunto de perguntas com grau de dificuldade nulo, quase nenhum conseguiu responder acertadamente a todas as questões que incluíam, por exemplo, o nome da chanceler alemã, quem escreveu “Os Maias”, que actor desempenhou o papel d’ “O Padrinho” ou qual é o maior mamífero da terra. Os nossos alunos “superiores” falharam redondamente no teste, mas em compensação riram-se muito: riram-se da vida, riram-se da ignorância e riram-se de si próprios. Desalmadamente convém frisar. Na realidade, estamos perante o corolário de anos e anos de desastre que relegou a exigência, a disciplina e o trabalho para segundas núpcias em detrimento de umas teorias muito interessantes que centraram o ensino no petiz e na sua capacidade e velocidade de aprendizagem. Teorias à parte, escusado será dizer que o petiz não se apresentou para aí virado e que determinadas [ausências de] velocidades acabaram por permitir que se chegasse ao décimo ano sem se conseguir escrever e, como agora se atesta, à própria universidade sem se saber nada sobre o mundo. Que isto provoque repulsa é mero acessório. No fundo, isto só pode espantar a quem anda desatento. Ou, sendo radical, a quem anda na lua.
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Estranhamente, os europeus mantém-se apáticos enquanto o mundo “pula e avança”. Engolidos pela voragem dos acontecimentos e impedidos de se moverem pelos diferentes “monstros” que criaram, parecem simplesmente à espera da estocada misericordiosa que ponha um fim à agonia vegetativa com que não conseguem lidar. Cimeiras, encontros, reuniões e namoricos de bastidores não apresentaram ainda uma única solução visível para a complexidade anormal que atravessamos. Esta inacreditável arrogância custará caro às gerações vindouras. De facto, o mundo transforma-se e a Europa, outrora o centro do mundo, torna-se periférica e, paulatinamente, inofensiva. Lá longe, os novos senhores do mundo não estão pelos ajustes e muito menos para aturar manias de superioridade. Mas o grande problema, não é vermos os nossos valores e direitos “universais” relegados. O grande problema é se um dia os novos senhores do mundo acordam e percebem a nossa infantil irrelevância.
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Hoje, na pausa da manhã, a televisão do café exibia a TVI e um programa de nome “Você na TV”. Os dois apresentadores – Goucha e uma senhora que não reconheço – falavam com Lili Caneças, Cinha Jardim e com um tipo novo – que não faço a mínima ideia de quem seja – sobre pessoas do “jet set nacional”.
Presumo que o indígena gosta mesmo de saber da vida dos outros e que adore este género de intriga mesquinha fomentada por gente “conhecida” e com idade para ter “juízo”. Presumo ainda que o indígena vibra com semelhantes dislates e com a assunção plena do que são vidas comovedoramente boçais e desinteressantes. No fundo, sempre presumi que o indígena vive mais preocupado com a aparência em detrimento da essência. Porque só isso fundamenta que o indígena em vez de se preocupar com a sua vidinha e em resolver os seus problemas, perca tempo siderado, e iludido, com a vidinha insonsa dos outros. E ao olhar para a Lili Caneças, disfarçada com menos 20 anos, dei comigo a pensar no enorme vazio que deve ser aquela existência. E quase que senti pena.
Depois de comodamente atirado para a quase irrelevância nas últimas eleições, o Dr. Louçã continua a sua senda profética à procura do Santo Graal que lhe garanta o soro da vida eterna. Agora pede um novo 25 de Abril com início já no próximo dia 24, dia da greve geral. Porquê? Porque é preciso “salvar a economia, salvar o respeito, salvar a democracia e trazer dignidade” e lutar “contra o empobrecimento e a exploração” e as políticas de “terra queimada”. Pelo meio, o Dr. Louçã “apenas” esqueceu-se de dar a conhecer os métodos que, temo, não difeririam muito dos processos revolucionários já conhecidos e experimentados um pouco por todo o lado.
Infelizmente, 37 anos depois do 25 de Abril original, não se vislumbra grande saída para a melindrosa situação em que Abril e as suas diatribes coloquialmente nos colocaram. E se o original não nos levou tão longe quanto o desejado, não se percebe por que razão uma fotocópia faria melhor. Aliás, o Dr. Louçã vive da RCA (Repetição Comunicacional Assistida), onde o disparate, para além de divertido, parece render votos ao adversário na exacta proporção com que se sonha com revoluções. Que continue este magnífico trabalho até porque, confesso-vos, o Dr. Louçã é o único comediante deste país que ainda me faz rir.
Fim-de-semana intenso com semi-final do campeonato nacional de equipas de bridge no Porto. Dois grupos de 8 equipas disputavam acesso à final (todos contra todos em rondas de 16 mãos), a realizar-se em Lisboa daqui a duas semanas. Apuravam-se as 4 melhores de cada grupo. A minha equipa (João Machado, José Macedo, Pedro Macedo, Jaime Sousa, Sílvio Costa e eu) ficou cedo pelo caminho, averbando 5 derrotas (!), 1 empate e 1 vitória. Um desastre. No outro grupo, a outra equipa madeirense (Miguel Teixeira, Rodrigo Martins Soares, Carlos Luiz e Ricardo Fernandes) acabou por morrer com a praia à vista. Participação evidentemente aquém do esperado. Como não podia deixar de ser.
Hoje, há 69 anos, teve início a Operação Úrano. Os soviéticos movimentaram nesse dia um milhão de homens, 13500 peças de artilharia, 1400 tanques e 1115 aviões, cercando em quatro dias o 6º Exército (330 mil homens) de von Paulus e criando o célebre “këssel” (caldeirão) de Estalinegrado. À fome, ao frio e atingido pelas doenças (disenteria e tifo, essencialmente), e impossibilitados de ser convenientemente reforçados e abastecidos pela Luftwaffe de Göring e confinados a uma área de 50 por 40 km, Paulus (promovido a Marechal de Campo pouco tempo antes, porque nunca um Marechal de Campo prussiano se havia rendido) e 92 mil sobreviventes do 6º Exército renderam-se em Janeiro do ano seguinte. Nem 10% regressariam vivos a casa depois da guerra terminar. Esta operação mudou a face da guerra e a sua frente oriental: dois anos e meio depois, o Exército Vermelho estava em Berlim, a 2200 km de distância de Estalinegrado. Pelo meio, a Alemanha Nazi foi invadida por 10 milhões de soldados soviéticos que só nos primeiros meses violaram qualquer coisa como 2 milhões de mulheres, incluindo compatriotas suas entretanto libertadas dos campos. A Operação Úrano começou às 7h20 da manhã e, dizem, fez a terra tremer a 50 quilómetros de distância.
Primeira ideia: quando se fala na baixa qualificação dos portugueses, é bom que se lembre que Portugal é dos países da Europa com menos licenciados (em proporção) e, simultaneamente, o país da Europa com mais licenciados no desemprego (também em proporção), numa notável incongruência.
Segunda ideia: em Portugal, o debate à volta do aumento da competitividade muito raramente é feito pelo lado da melhoria dos processos produtivos, da visão estratégica, da inovação ou enquadrado na própria falta de qualificação dos patrões, que não verdadeiros empresários. Logo, sempre que se fala em aumento de competitividade na economia portuguesa quer-se efectivamente dizer, e não se iludam com isso, baixar salários.
Durante o Fórum de Cooperação Empresarial Portugal China 2007, o ministro Pinho anunciou por terras chinesas que Portugal era um bom país para os investimentos chineses porque os nossos custos salariais eram inferiores à média da União Europeia e sofriam menos pressão do que nos países do alargamento. Esse foi um dos argumentos que utilizou para justificar um bom investimento. Daí para cá, os funcionários públicos já viram esfumar-se dois subsídios e parte do seu salário e todos os portugueses sentiram a subida generalizada dos impostos e a perda de poder de compra. Agora é a própria troika, que ainda não satisfeita com o sufoco generalizado nem com os resultados catastróficos que nos esperam, que recomenda o abaixamento dos salários dos privados como método de aumentar a nossa competitividade de exportação. Pinho foi nesse tempo acusado, entre outras coisas, de ter feito declarações “com carácter terceiro-mundista” (PSD)e “inaceitáveis” (CDS/PP). A visão de Pinho está, no entanto, prestes a cumprir-se. Bem-vindos a um "inaceitável terceiro mundo".
Vale a bolinha que alegra um povo massacrado, ainda que não lhe dê assim tanto de comer. Mas frise-se que a vida continua encadeada pelos apuros sem fim à vista. E olhar para os jornais do dia reforça plenamente a convicção de que as coisas pioram, de que há mais países ameaçados e de que a crise acampou indefinidamente no nosso quintal. Hoje, quando despertamos da ataraxia que por momentos nos inebriou ao sabor dos golos apoteóticos de sublime execução, continuamos a sentir na pele as agruras do caos instalado e da nossa falência enquanto povo soberano. Se fôssemos tão bons no resto como o somos no futebol de selecções, talvez tudo fosse mais fácil. Mas não somos. E esse é o problema.
Regressando. Lentamente, mas regressando.
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